11 abr, 2025 - 14:01 • Redação, com Lusa
O videojogo “No Mercy”, que incentiva a violência sexual contra as mulheres, já não está disponível em Portugal. A empresa Zerat Games retirou-o da plataforma de distribuição Steam Portugal, após inúmeras denúncias e críticas
“No Mercy”, em português, “Sem piedade”, desafia os protagonistas masculinos a “tornarem-se o maior pesadelo das mulheres” e a “nunca aceitarem um ‘não’ como resposta”.
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“Este é um jogo de escolhas e uma novela visual para adultos com foco no incesto e na dominação masculina. No caso de a tua mãe ter destruído a tua família, tu tens um novo papel: não é resolver a situação, mas, sim, tomá-la como tua. Descobre os seus segredos obscuros, domina-a e torna tuas todas as mulheres”, lê-se na sinopse do videojogo.
“Tomámos a decisão de retirar o ‘No Mercy’ da Steam”, lê-se num comunicado da Zerat Games. A empresa pede desculpas a quem considera que “o jogo não devia ter sido criado” e solicita maior abertura relativamente a “fetiches humanos que não prejudicam ninguém, mesmo que te pareçam nojentos”.
Sublinham ainda: “Isto continua a ser apenas um jogo e, embora muitas pessoas estejam a tentar transformá-lo em algo mais, continua a ser e continuará a ser um jogo”, acrescenta.
O jogo já tinha sido bloqueado na Austrália, em Inglaterra e no Canadá. A Zerat Games diz que não quer “lutar contra o mundo inteiro” e que não quer causar problemas à Steam.
"Caro Mundo. Tem havido muito barulho sobre o jogo No Mercy. (...) Foram muitas vezes repetidas informações falsas sobre o conteúdo do jogo. As pessoas criaram vídeos e falaram com grande convicção de coisas que não estavam no jogo", afirma a empresa no comunicado.
A criadora do jogo refere ainda que, "infelizmente, muitas pessoas confundem ficção com realidade, criando histórias fabricadas em que as pessoas que jogam ‘No Mercy’ saem para a rua e cometem atos vis".
O jogo estava na quinta-feira disponível na plataforma portuguesa, por 11,79 euros. Algumas figuras públicas manifestaram-se contra a comercialização do videojogo, atraindo a atenção mediática para o tema.
Foi o caso de Nuno Markl que, nas redes sociais, escreveu: "A partir do momento em que a Steam, a maior plataforma de videojogos do mundo, aceita vender um jogo independente manhoso, grotesco, cujo objetivo é, exclusivamente, abusar do máximo de personagens femininas percebemos uma vez mais o quão desigual é este braço de ferro que temos de fazer com o mundo para que os miúdos não se tornem psicopatas".
Também no Instagram, Sónia Tavares disse não saber "mais o que dizer ou fazer" perante uma "luta que já parece inglória", apelando à assinatura da petição contra a violência das mulheres.
O Centro Nacional de Exploração Sexual dos Estados Unidos (NCOSE) pediu esta quarta-feira a remoção global do videojogo "No Mercy" devido a conteúdos "perturbadores".
O NCOSE instou a Steam a removê-lo da sua plataforma, alertando que "promove violência sexual explícita, incesto, chantagem e dominação masculina, incentivando explicitamente os jogadores a se envolverem em atos não consensuais e comportamento misógino".
"O jogo continua disponível globalmente, inclusive nos Estados Unidos, perpetuando a sua influência prejudicial sobre milhões de usuários, incluindo menores que podem facilmente burlar as medidas de verificação de idade", lamentou.
O Movimento Democrático de Mulheres vai apresentar uma queixa ao Ministério Público e junto da Comissão para a Igualdade de Género contra os autores do jogo "No Mercy".
Em comunicado, o Movimento Democrático de Mulheres (MDM) defende que o videojogo "promove a violência sexual e misoginia" e exige, por isso, que as plataformas tecnológicas sejam responsabilizadas.
Sustenta que o conteúdo do videojogo constitui "uma grave incitação à violência contra as mulheres, normalizando práticas de ódio e discriminação que violam princípios constitucionais e legais fundamentais".
Na opinião do MDM, o mundo vive atualmente "num sistema económico que transforma tudo em lucro" e que "não hesita em disseminar conceções que objetificam, mercantilizam e violentam as mulheres, ignorando e violando valores e direitos humanos fundamentais".
"É preciso deixar de compactuar com os gigantes tecnológicos. Quem promove, aloja ou lucra com conteúdos que alimentam a violência contra as mulheres deve ser responsabilizado, sem exceções", defende o MDM.
Acrescenta que só a indignação não basta e defende, por isso, que as entidades competentes tomem as medidas adequadas para interromper a proliferação de conteúdos que promovem e banalizam a violência contra as mulheres.
A Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género agiu e fez queixa junto do Ministério Público contra a plataforma Steam.
Numa nota divulgada na página de Instagram, o organismo diz ter contactado a plataforma para que retirasse o jogo e "remeteu denúncia ao Ministério Público por comercialização de conteúdo potencialmente enquadrável na propagação de discurso de ódio contra as mulheres, apologia da violência sexual e incitamento à prática de crimes sexuais".
A CIG aproveita para agradecer publicamente a todas as pessoas e instituições "que se mobilizaram no dia de ontem [quinta-feira] para denunciar a disponibilização e comercialização, em território nacional, do videojogo intitulado "No Mercy", que promove a violência sexual contra as mulheres".
"Foi graças à indignação manifestada por inúmeras mulheres e homens nas redes sociais e à atuação de todas as pessoas que acederam à plataforma Steam para denunciar o conteúdo de incitamento ao ódio presente no referido videojogo, que este foi, entretanto, removido e já não se encontra disponível em Portugal", diz a CIG.