01 fev, 2025 - 16:33 • Tomás Anjinho Chagas
João Cotrim de Figueiredo, antigo líder da Iniciativa Liberal, defende a expulsão de Tiago Mayan Gonçalves do partido.
Em entrevista à Renascença, durante a IX Convenção dos liberais, o atual eurodeputado condena os "ilícitos" que Mayan Gonçalves - que ele próprio escolheu para candidato à presidência da República em 2021 - cometeu quando era presidente da Junta de Freguesia da Foz, no Porto.
Porto
Militante da Iniciativa Liberal deixa a presidênci(...)
Cotrim de Figueiredo defende ainda uma coligação da Iniciativa Liberal com Carlos Moedas para evitar uma "nova maioria de esquerda em Lisboa" e acredita que Mariana Leitão, atual líder parlamentar, seria uma "excelente candidata" à presidência da República - apesar de não excluir o nome de Rodrigo Saraiva.
Oiça aqui a entrevista a João Cotrim de Figueiredo, ou leia-a aqui em baixo.
Está feliz de voltar a Portugal e entrar momentaneamente na política nacional?
Gosto muito de convenções, se calhar é uma perversão qualquer, mas gosto. Gosto do ambiente, da discussão, de rever as pessoas e gosto de ter uma oportunidade de discutir ideias e participar nas escolhas que a Iniciativa Liberal faz.
Há dois anos saiu da liderança do partido. Depois de Cotrim, a Iniciativa Liberal abriu um fosso e ficou dividida?
Na convenção eletiva de 2023 houve, de facto, um ambiente que dificultou o trabalho da comissão executiva que daí resultou. A parte mais mediática da divisão e o tom em que essas discussões tiveram lugar marcou um bocadinho a análise que foi feita do nível de divisão do partido. Não acho que as nossas divergências sejam superiores a qualquer outro partido espetro português, digam-me um que não tenham facões. Talvez não tenham, é o grau de, capacidade de fazer memes, "memeável", talvez as coisas não tenham sido tão "memeáveis" como a nossa convenção. Isso dificultou o primeiro mandato do Rio Rocha, mas eu espero que esta convenção seja exatamente a oportunidade de passar um pano por cima dessas diferenças e passarmos uma ação política muito mais virada para fora, muito mais otimista,
Tem havido uma crise de notoriedade mediática do partido desde que saiu?
Acho que não, o Rui Rocha acabou de revelar alguns números, a IL está hoje muito mais presente nos meios do que estava no passado. As coisas estão a melhorar, mas ainda há trabalho de notoriedade a fazer do partido e sobretudo das suas posições. Mas já não acho que seja um óbvio dramático a afirmação do liberalismo em Portugal.
O caso, por exemplo, de Bernardo Blanco, que já assumiu que um dia quer vir a ser líder da IL, acha que pode ser o próximo líder mais parecido consigo em termos mediáticos?
Vocês sabem que eu gosto muito do Bernardo e o Bernardo faz o favor de gostar de mim e querem, com isso, fazer outros tipos de equivalências. Ele pensa com a própria cabeça e uma das coisas que pensa é que gostaria um dia de presidir o partido, é uma ambição legítima. Eu nunca teria anunciado anos antes disso poderia vir a ser uma realidade, mas se lhe perguntaram e ele não quis fugir à pergunta, se calhar teve de ser. Reconheço-lhe todas as qualidades políticas e pessoais para ser um excelente líder partidário e alguém influente na política portuguesa um dia mais tarde. Para mim ele fez uma coisa mais interessante, percebeu que para ter capacidade de exercer uma vida política com pleno aproveitamento tem que se afastar dela durante os tempos. isso é de uma grande clarividência e deve ser assinalado, não é frequente.
E quanto ao João Cotrim de Figueiredo, agora que está há alguns meses na Europa, sente falta de mediatismo lá fora?
Não, porque eu nunca procurei mediatismo, continuo a sentir que tenho acesso à comunicação social que preciso e que nesta fase era importante não dar qualquer hipótese de haver interpretações de que eu era uma presença tutelar no partido, ou que queria ofuscar fosse quem fosse.
Não está minimamente arrependido?
De ter saído da liderança do partido? Não.
E de ter ido para a Europa?
Ter ido para a Europa nunca foi um objetivo, na tal convenção eletiva de 2023 perguntaram-me se ia para a Europa e eu disse que não estavam nos meus planos, não era um sonho de criança, nem de adolescente, nem de adulto, nunca foi um objetivo. Mas, quando o Rui [Rocha] me diz, a meio do seu mandato, que as eleições europeias são uma marca importante - não só para IL entrar no Parlamento Europeu onde não tinha representação, mas para estabelecer uma fasquia de votação que mostra às pessoas a capacidade de crescimento que a IL tem - quando me põe isso nestes termos e que não havia outra pessoa capaz de corporizar essa candidatura que não fosse eu, eu reconheci a importância do argumento e reconheci que era verdade, que realmente eu era a única pessoa para poder fazer aquela candidatura. Não vou dizer que foi um sacrifício muito grande, mas faço-o com sentido de missão.
Custa-lhe estar lá fora ou está a gostar?
Ainda não estou a gostar, mas estou perto de perceber como é que irei gostar, porque a minha satisfação na política é conseguir mudar coisas e a máquina europeia é bastante mais pesada, bastante mais difícil de mudar, de pôr a mexer do que em Portugal. Posso dizer-vos que hoje o Grupo Renovar a Europa, comparado com o que era quando eu assumi as funções de vice-presidente, já é bastante diferente. É bastante mais liberal na forma como olha para a liberdade de expressão, para a concorrência ou para o comércio livre. O caminho faz-se caminhando e começo a ver maneiras de produzir mudanças concretas, e se conseguir fico satisfeito e posso dizer que estou a gostar de o meu mandato.
Nas últimas presidenciais, João Cotrim de Figueiredo escolheu Tiago Mayan Gonçalves para ser o candidato. Depois dos problemas a que todos assistimos na junta de freguesia da Foz, acha que devia ser expulso do partido também para dar o exemplo para fora?
O assunto está entregue ao Conselho de Jurisdição, vamos deixar o Conselho...
Mas tem uma opinião...
Tenho, tenho, e estou a hesitar se devo emitir uma opinião antes do Conselho de Jurisdição, mas vou fazê-lo porque acho que sim. Acho que uma pessoa que comete aqueles ilícitos não tem lugar num partido como a Iniciativo Liberal.
E para as próximas presidenciais de 2026, gostava de ver uma mulher na corrida da Iniciativa Liberal a Belém?
Isso é uma maneira indireta de perguntar se que gostava de ver a Mariana Letão, gostava. Gosto muito da Mariana, ela daria uma excelente candidata, mas não a vou escolher em detrimento de um Rodrigo Saraiva, por exemplo, de quem também sou amigo e cujas qualidades políticas também aprecio muito. Fiz questão de não saber qual foi a escolha de Rui Rocha para levar aos órgãos nacionais, como dizia um autor nas suas caricaturas, numa altura em que toda a gente em Portugal conseguia comprar títulos nobiliárquicos, "foge cão que te fazem barão". Se estivesse muito perto do processo de decisão tive medo de sair de lá candidato. O partido não deve insistir na minha pessoa para candidato a tudo e mais alguma coisa, ao contrário do que fazem outros.
Já disse que por regra, a IL deve ir sozinha a votos nas eleições autárquicas, mas disse que algumas cidades grandes merecem consideração, Lisboa merece ser uma exceção?
Merece, e o Porto também, se calhar há mais uma ou duas, mas eu vergo-me, à análise que os núcleos territoriais da IL nesses concelhos fazem. Esses concelhos que falámos têm leitura nacional e a opinião da Comissão Executiva também é importante. Eu pessoalmente, não faço parte de nenhum órgão do Partido, teria muita pena que a IL pudesse contribuir para o regresso de uma maioria de esquerda na Câmara de Lisboa.
Rui Rocha não tem fechado essa porta, mas também tem dito que ainda não está nada decidido e pede a Carlos Moedas para se aproximar das ideias liberais. Teme que este finca-pé, estas exigências, possam deixar a esquerda regressar ao poder na Câmara de Lisboa?
É um receio que tenho, sim. As negociações em política dependem da vontade de cada um e tem dois grandes tabuleiros, os tabuleiros das medidas programáticas e o dos cargos que vão substanciar a importância relativa dos partidos coligados. Em qualquer uma destas negociações pode haver entradas e impossibilidade de chegar a acordo. Ver se ambos querem, talvez seja a parte mais fácil e depois chegar a acordo sobre cada um daqueles dois tabuleiros.
Acha que querem?
Acho que o mais fácil é haver coincidência de vontade. Mas não falei com o núcleo de Lisboa, não sei o que é que vai recomendar. Se o núcleo se opuser determinadamente é difícil a Comissão Executiva passar por cima dessa vontade.