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Cedência de quotas de Montenegro à mulher "é um ato nulo sem efeito jurídico"

20 fev, 2025 - 19:45 • Liliana Monteiro , com redação

Caso da empresa familiar de Luís Montenegro pode configurar uma incompatibilidade moral ou política, mas “não encerra nenhum tipo de incompatibilidade jurídica”, diz especialista em Direito Administrativo.

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O primeiro-ministro, Luís Montenegro, cedeu a quota na Spinumviva, mas na prática continua a ser sócio da empresa que tem com a mulher e filhos e que se dedica a consultoria, gestão e comércio de imóveis, explica Paulo Graça, especialista em Direito Administrativo, em declarações à Renascença.

A transmissão de quotas feita à mulher, em agosto de 2022, é nula e por isso sem efeito prático, sublinha.

“A nulidade significa que não pode haver nenhum efeito jurídico ou prático deste ato. Isto significa o seguinte: se o cônjuge Luís passou à cônjuge Maria uma quota, não o podendo fazer, essa passagem formal não tem qualquer consequência prática e continua-se a entender que a quota é do cônjuge Luís. Não há sequer necessidade de ir a um tribunal para se obter uma sentença que declare isto, porque um ato nulo não produz nenhum efeito jurídico”, afirma Paulo Graça.

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O especialista em Direito Administrativo sublinha que a cedência de quotas entre marido e mulher não é possível à luz da lei portuguesa.

“É um ato nulo, porque não pode haver negócios entre os cônjuges na constância do casamento, designadamente quando há um casamento em comunhão de bens adquiridos. Neste caso, não pode haver contratos de compra e venda ou de cessão de quotas entre cônjuges. Se este contrato foi feito, é um contrato que viola a lei e é nulo.”

Pode um primeiro-ministro ter uma empresa? Este especialista explica que sim, mas há vários impedimentos.

“O primeiro-ministro pode ter uma quota numa empresa, não pode é, por si próprio ou através dessa empresa, participar em procedimentos de contratação pública, não pode intervir como consultor ou praticar qualquer ato em procedimentos de contratação pública. Um primeiro-ministro não pode ser gerente de uma empresa. Poderá ser sócio, desde que a empresa não tenha esta atividade. Se tiver, fica numa situação de impedimento de exercício deste tipo de atividade.”

A empresa terá atividade limitada. Não poderá fazer negócios ou dar consultoria a autarquias ou empresas públicas, sublinha Paulo Graça, em declarações à Renascença.

No caso de uma empresa detida apenas pela mulher do primeiro-ministro, há também restrições e impedimentos previstos na lei: “apenas não pode intervir em relação a procedimentos de contratação pública que sejam desencadeados pelo Governo”, sublinha Paulo Graça.

Se a empresa pertencer apenas aos filhos, não existe nenhuma situação de incompatibilidade.

O especialista em Direito Administrativo diz que o caso não apresenta, pelo que é conhecido, qualquer incompatibilidade jurídica.

Na leitura de Paulo Graça, o caso da empresa familiar de Luís Montenegro pode configurar uma incompatibilidade moral ou política, mas “não encerra nenhum tipo de incompatibilidade jurídica”.

Quando Luís Montenegro deixar de ser primeiro-ministro, todos estes impedimentos terminam. “A única coisa que a lei proíbe é que os titulares de cargos públicos exerçam funções em empresas privadas que prossigam atividades no setor que eles tenham tutelado diretamente”, sublinha o especialista em Direito Administrativo.

Foi nula a transmissão de quota feita por Luís Montenegro à mulher, reforça o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e do Notariado, Arménio Maximino.

A Renascença teve acesso à certidão do registo comercial que mostra que foi em agosto de 2022 que Luís Montenegro decidiu dividir a sua quota na Spinumviva com a mulher e filhos.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e do Notariado explica que o ato é aceite pelos registos, mas é ilegal.

O Sindicato espera que esta polémica possa motivar uma mudança na lei, para que as pessoas possam voltar a acreditar nos Registos e estes possam praticar todos os atos de verificação legal quando atestam informação.

Desde 2006 que as alterações por depósito no registo comercial deixaram de estar sujeitas a verificação legal e verificação da lei.

Montenegro declarou empresa

Na declaração de rendimentos e património consultada pela Renascença, Luís Montenegro continuava a declarar, no final de 2024, uma percentagem de participação social de 70% na empresa Spinumviva, Lda, no valor de 4.200 euros.

Em resposta à Renascença, o Tribunal Constitucional, órgão responsável pela Entidade para a Transparência, esclarece que as informações introduzidas nas declarações únicas pelos titulares de cargos políticos são “da sua responsabilidade”.

Após a entrega de cada declaração, a mesma permanece sem ser publicada durante um período de 30 dias, no qual o titular pode proceder à correção dos dados declarados. No final do prazo, a declaração é publicada automaticamente, passando a poder ser consultada.

“A Entidade para a Transparência apenas inicia a verificação das declarações a partir do momento em que se encontram no estado de publicada”, indica o órgão, referindo que a mesma resulta da “análise e fiscalização da declaração única”.

A Renascença questionou a Entidade para a Transparência e o Tribunal Constitucional para saber se a declaração única de Montenegro já começou a ser verificada ou se foi solicitado algum esclarecimento ao primeiro-ministro, não tendo recebido resposta até ao momento.

O primeiro-ministro garante estar tranquilo em relação à empresa familiar e promete prestar todos os esclarecimentos, esta sexta-feira, no Parlamento, no debate da moção de censura apresentada pelo Chega.

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