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TRÊS ANOS DE GUERRA NA UCRÂNIA

Discussão sobre envio de tropas para Ucrânia “já chegou”. Deputado do PSD pede para “acelerar” investimento na Defesa

23 fev, 2025 - 15:00 • Susana Madureira Martins

Na véspera de se cumprirem três anos de invasão da Ucrânia pela Federação Russa, o presidente da Comissão parlamentar de Assuntos Europeus, Telmo Faria, alerta para a necessidade de a União Europeia concertar posições.

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O presidente da Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus, Telmo Faria, defende, em entrevista à Renascença, que, no atual contexto internacional, “é preciso acelerar” o investimento na Defesa na União Europeia e não mostra dúvidas que a discussão sobre o eventual envio de tropas para a Ucrânia “já chegou”.

O deputado do PSD recusa, no entanto, que esse “reforço” na Defesa signifique uma desagregação da NATO. Acredita que a UE possa “ter uma voz mais continental, mais europeia, com mais força”, mas sem o desaparecimento do bloco atlântico.

Numa conversa que decorreu no Parlamento, Telmo Faria admite o clima de “incerteza” que faz hoje “parte hoje da situação política internacional”, sobretudo a partir do momento em que a nova administração Trump entrou em funções.

Face a uma eventual posição comercial mais rígida dos Estados Unidos da América, o deputado social-democrata defende que a UE deve começar a pensar em defender o comércio europeu e desenvolver o “Buy European Act”, já proposto pelo presidente francês Macron, recusando que se trate da adoção de uma nova política de protecionismo na Europa.

Vamos ter mais um aniversário sobre a invasão da Ucrânia. Tem havido cimeiras, agora temos a nova administração Trump. É um cenário de incerteza o que estamos a viver na Ucrânia e até na União Europeia como um todo?

Sim, a incerteza faz parte hoje da situação política internacional e no fundo das nossas vidas. Mas, acima de tudo, estamos a assinalar aquilo que era uma designada operação militar especial que tinha tudo para ser rápida e não se iria configurar naquilo que acabamos por ver no maior conflito militar desde a Segunda Guerra Mundial na Europa.

A guerra da Ucrânia ganhou uma capacidade de resistência por parte do exército ucraniano, que teve aqui durante estes últimos 3 anos também muitos impasses, muitos avanços, muitos recuos, mas acima de tudo uma cimentação daquilo que é uma unidade no apoio à Ucrânia por parte do Ocidente. Isso acontece, sobretudo, até o início deste ano e ao início da nova administração de Trump.

Em matéria de defesa, agora, parece haver uma certa ideia punitiva de que a Europa não se defendeu. A NATO foi feita para defender a Europa e foi esse o modelo que foi pensado numa grande organização transatlântica que juntasse, sobretudo, os Estados Unidos da América com a Europa.

É a própria NATO que pode ficar em causa e haver até uma eventual desagregação da Organização?

Não me parece que esteja em causa a NATO, não me parece que nesse modelo de defesa, a Europa fique absolutamente sozinha. Parece mais uma utopia retórica do que propriamente uma realidade nova, no sentido de ganharmos consciência e se temos mesmo de fazer isto a sós dentro da Europa.

Hoje precisamos, acima de tudo, é de ganhar consciência, uma consciência que fomos perdendo, generosamente, por causa desse grande acordo que nasce em 1949, dessa grande organização atlântica, chamada NATO. Portanto, não acredito que tenhamos hoje condições de desagregar esse modelo, que tão bem-sucedido foi. Acredito sim, que possamos ter uma voz mais continental, mais europeia, com mais força, isso sim, dentro desse bloco atlântico, mas que ele não vai desaparecer.

Não me parece que, do ponto de vista estratégico, a Europa tenha feito nada de errado. O que fez foi assegurar a sua própria paz através desta organização. O que a guerra da Ucrânia nos trouxe ao fim de três anos é a necessidade de continuarmos a apoiar as democracias dentro da Europa como grandes bastiões.

Vamos ver como é que isto vai evoluir. Isto obriga a Europa a dar respostas, mas dentro daquilo que é a Europa de 27 chefes de governo, e não apenas de um. Não somos um Estado federal que tem um presidente que acumula e tem toda a competência na área da política externa ou na área da defesa. Temos de conciliar posições e há posições que são diferentes entre os Estados-membros, mas isto não retira nada ao potencial que a Europa tem de ter de reforçar a sua linha de defesa, da sua própria segurança.

Espero que a Presidente da Comissão [Europeia] e o Presidente do Conselho Europeu, com esta deslocação a Kiev, possam também afirmar que temos de reconhecer e apoiar democraticamente a Ucrânia e Zelensky. Se nos pudermos sentar à mesa das negociações e fazer com que esta paz seja uma paz equilibrada, estou certo que abrimos caminho para o acelerar da integração da Ucrânia na União Europeia. Isso os líderes europeus podem fazer, sem ignorar os critérios de Copenhaga, sem pôr tudo em causa. Temos que acelerar muita coisa.

Fala da necessidade de a Europa reforçar a sua defesa. Para além do apoio com equipamento militar e de todo o apoio financeiro à frente ucraniana, tem surgido a discussão de os países europeus, numa outra fase, terem de colocar forças militares dentro da Ucrânia. Essa discussão vai chegar mais cedo ou mais tarde a Portugal?

Já chegou. Todas as iniciativas que passam dentro da Europa têm um nível de articulação que não colocam nenhum país de fora e Portugal está nessa conversa, o governo português está, naturalmente, a acompanhar. Portugal tem aqui um papel muito interessante.

A nível de forças militares no terreno, a discussão vai chegar?

Vai chegar. Nós temos de aumentar o dispositivo e os investimentos na área da defesa, isso está assumido, assumidíssimo politicamente e está a ser desenvolvido, é preciso acelerar. É preciso também fazer caso daquilo que tem sido a nossa tradição transatlântica.

Nós, como país europeu, podemos dar aqui um contributo para que este esforço de defesa europeu nunca deixe de ter uma dimensão para além da continental, ou seja, do continente europeu. Começamos por onde? Que indústria militar? Como é que vamos continuar a desenvolver a nossa indústria? Se lidamos do outro lado, por exemplo, com uma guerra comercial, sem pôr em causa as regras da Organização Mundial do Comércio, não será tempo de pensarmos, quando estamos a desenhar mercados únicos e incentivos à inovação e à competitividade, num “Buy European Act”? Criar um maior apoio e o maior incentivo para que os serviços e sobretudo os produtos e as mercadorias sejam compradas entre os europeus, sejam fabricadas pelos europeus, que a indústria possa crescer à custa dessa necessidade. Somos mais de 450 milhões, podemos crescer, temos um alargamento como política estratégica.

Isso não é protecionismo?

Não, é uma resposta. Nós temos que ser adeptos do comércio livre, a União Europeia está, neste momento, a celebrar vários convénios comerciais, acabou uma longa negociação de muitos anos com o Mercosul, está a fazê-lo com a África do Sul, com o Canadá, com a Índia, com a Suíça, dentro da própria Europa. É fundamental saber reagir quando algum parceiro ou algum aliado nos coloca, momentaneamente, determinado tipo de restrições. Há que responder com força, se não usarmos a força nunca seremos respeitados.

Com este novo discurso de que é preciso que a Europa e Portugal reforcem a sua própria defesa, as pessoas vão perceber que é preciso comprar mais equipamento militar e investir em equipamento militar e, se calhar, desinvestir um pouco noutras áreas mais sociais?

Não desagrego de um lado a área social e do outro lado a economia. Se apostarmos mais na indústria militar, se fabricarmos mais, teremos mais empregos militares, fabricaremos mais produtos dessa natureza, eventualmente, menos de outra. Os ganhos nos impostos, na arrecadação, no crescimento da riqueza, repercutem-se sempre com a sua distribuição na nossa sociedade e é isso que nunca pode deixar de estar em cima da mesa. Não podemos é fazer esse discurso da dicotomia, de um contra o outro, o social de um lado, o militar do outro. Até porque, para haver uma distribuição de riqueza precisamos de ter riqueza e para haver riqueza precisamos de ter segurança. Não se cresce economicamente, não podemos pensar no futuro, não há investidores, não há investimento, não haverá novos empregos, se nós não tivermos uma ideia de que teremos futuro para começar.

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