07 mar, 2025 - 14:11 • Manuela Pires
Foram muitas as críticas das deputadas de vários partidos no dia em que o Parlamento recebeu a sessão solene evocativa dos 50 anos da universalização do direito das mulheres ao voto em Portugal. Livre e Bloco de Esquerda, por exemplo, apontaram o dedo à forma como o Parlamento organizou a sessão e às ausências dos membros do Governo e do Presidente da República.
A iniciativa desta sessão solene foi do Livre e a data foi escolhida por ser a véspera do Dia Internacional da Mulher, que se comemora amanhã 8 de março, mas, logo no discurso desta manhã, Isabel Mendes Lopes acusou o Parlamento de falta de consideração pelos direitos das mulheres. “Não há falta de conhecimento de como organizar uma sessão solene, há sim uma grande falta de consideração por esta sessão e pelos direitos das mulheres”, referiu a líder parlamentar do Livre.
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“Lamento muito dizer Sr. Presidente, também pela forma como esta Sessão Selene foi organizada e está a acontecer. Passado um mês, como é que chegamos esta semana e nada estava previsto? Como é que não saíram os convites a todas as associações e entidades que lutam diariamente pelos direitos das mulheres e que deviam estar hoje aqui connosco?”, contestou.
As críticas chegaram também pela voz da deputada do Bloco de Esquerda, Joana Mortágua que sublinhou, além da ausência das associações que defendem os direitos das mulheres, a ausência do Presidente da República e do Governo na sessão.
“Saúdo os presentes e as presentes, saúdo para não deixar de notar os ausentes, a começar pelo primeiro-ministro, pelo Governo, pelo Presidente da República, que demonstram que, sendo solene, esta cerimónia é de uma solenidade menor do que as outras cerimónias solenes que acontecem tão frequentemente nesta Assembleia da República”, disse Joana Mortágua e foi aplaudida pelas bancadas da esquerda.
Na manhã de sexta-feira, das deputadas — os únicos homens a discursar na sessão foram João Almeida do CDS e o presidente da Assembleia da República — lembraram o que se conquistou ao longo destes 50 anos no que toca aos direitos das mulheres, mas também deixaram avisos sobre o que falta fazer para garantir, por exemplo, mais mulheres na política.
Teresa Morais, vice-presidente do Parlamento e deputada do PSD lembrou que em 2002 integrou uma delegação parlamentar da NATO constituída por 13 homens, onde ela era a única mulher: “Cheguei a ser confundida com a mulher de um deputado.”
A deputada lembra que dos 230 deputados, apenas 76 são mulheres e defende o aumento das quotas de forma a garantir mais mulheres sentadas na bancada dos deputados.
“Mas para isso existe uma solução, que não sendo certamente consensual, é o passo que nos falta dar para a verdadeira paridade. Sejamos mais exigentes na representação mínima obrigatória de mulheres e de homens nas listas eleitorais e o problema resolve-se”, diz Teresa Morais.
A lei da paridade prevê atualmente 40 por cento para cada género em eleições legislativas, mas a você-presidente do Parlamento reconhece que há outros fatores que afastam as mulheres da política e um deles é a falta de condições para conciliar a vida familiar e profissional.
“Acabe-se com a conversa estafada de que é difícil trazer as mulheres para a política. Aprofundem-se as condições de equilíbrio entre a vida familiar pessoal e profissional e elas virão, como já vieram muitas das deputadas que aqui hoje se encontram, apesar da família que fica longe, muitas com filhos pequenos e dos longos quilómetros que percorrem todas as semanas” rematou.
A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, avisou que há um retrocesso em muitos direitos das mulheres e um aumento do discurso misógino e da violência doméstica contra as mulheres.
“É preciso celebrar, mas também fazer alertas. A misoginia está a crescer. Este mesmo Parlamento é muitas vezes palco disso mesmo. Os números da violência doméstica e da violência contra as mulheres aumentam e assiste-se a um retrocesso em vários direitos das mulheres, desde o desinvestimento efetivo em políticas de igualdade, às limitações ao direito à saúde reprodutiva assegurada no papel, mas tantas vezes negada na prática, passando pela desigualdade salarial e no mercado de trabalho”, referiu a socialista.
A encerrar a sessão, o presidente da Assembleia da República defendeu que a sessão é de todos e não do ‘wokismo’ nem do populismo e responsabilizou os partidos e o Parlamento pelo afastamento das mulheres da política. “Os estudos dizem-nos que as mulheres votam mais que os homens. O problema não é assim seguramente das mulheres. É dos partidos que precisam definir melhor os mecanismos de recrutamento. E do Parlamento que precisa de cuidar melhor da relação com a sociedade e o território”, disse José Pedro Aguiar Branco.
Dizendo acreditar na “força do exemplo”, o presidente do Parlamento fez questão de evocar várias mulheres, começando por Carolina Beatriz Ângelo, a primeira mulher que exerceu o direito de voto em 1911, depois de processar o Estado. Aguiar Branco apontou ainda Margarida Tengarrinha, Alda Nogueira, Maria Teresa Horta ou Amália Rodrigues.