13 mar, 2025 - 23:02 • Miguel Marques Ribeiro com Lusa
A dissolução da Assembleia da República anunciada esta quinta-feira é a 10.ª desde o 25 de Abril de 1975, sendo a terceira vez que Marcelo Rebelo de Sousa usa este poder constitucional para dissolver o parlamento nacional.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, em funções desde 2016, anunciou esta quinta-feira uma nova dissolução do parlamento nacional e a convocação de eleições antecipadas para 18 de maio. Marcelo Rebelo de Sousa já tinha dissolvido a Assembleia da República em dezembro de 2021 e em 9 de novembro de 2023.
"O Presidente da República decidiu, assim, depois de ouvir os partidos políticos nela representados e do parecer do Conselho de Estado, que irá dissolver a Assembleia da República e marcar as eleições para o dia 18 de maio de 2025", lê-se num comunicado divulgado na página da Presidência da República.
O primeiro chefe de Estado eleito em democracia, António Ramalho Eanes (Presidente entre 1976 e 1986), dissolveu o parlamento três vezes: em setembro de 1979, em fevereiro de 1983 e em julho de 1985.
Mário Soares (1986-1996) utilizou uma vez o poder de dissolução, em abril de 1987.
Jorge Sampaio (1996-2006) dissolveu duas vezes a Assembleia da República, em janeiro de 2002 e em dezembro de 2004.
Aníbal Cavaco Silva (2006 a 2016) dissolveu uma vez o parlamento, em abril de 2011.
Segue-se uma descrição de cada um dos anteriores processos de dissolução, por ordem cronológica.
A primeira dissolução aconteceu na sequência da demissão do então primeiro-ministro, Carlos Alberto da Mota Pinto, apresentada em 7 de junho de 1979, alegando "obstrução sistemática da Assembleia da República" à ação do IV Governo Constitucional -- o segundo governo de iniciativa presidencial, nomeado por Ramalho Eanes sem suporte no parlamento.
O primeiro-ministro demitiu-se num contexto de crise orçamental, com o Orçamento Geral do Estado para 1979 rejeitado numa primeira versão na generalidade, em março, e a segunda versão aprovada com alterações na especialidade, no início de junho, e as Grandes Opções do Plano duas vezes rejeitadas.
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Das legislativas intercalares de 2 de dezembro de 1979 saiu vitoriosa a coligação pré-eleitoral Aliança Democrática (AD) composta por PSD, CDS e PPM, que conseguiu maioria absoluta na nova composição do parlamento, que só durou um ano, completando a I Legislatura, nos termos na altura previstos na Constituição. A AD conseguiria nova maioria absoluta nas legislativas de 5 de outubro de 1980.
A segunda dissolução do parlamento aconteceu na II Legislatura, também na sequência da demissão do primeiro-ministro, no caso, Francisco Pinto Balsemão, que chefiava o VIII Governo Constitucional, o terceiro da AD, e comunicou a decisão de deixar funções governativas em 18 de setembro de 1982, seis dias após eleições autárquicas, declarando que tinha tomado essa opção "há muito".
A dissolução foi formalizada em 4 de fevereiro e as eleições legislativas antecipadas marcadas para 25 de abril de 1983, contra o parecer do Conselho de Estado, que, segundo o decreto publicado em Diário da República, foi ouvido em 20 de janeiro e "pronunciou-se no sentido de que a Assembleia da República não deve ser dissolvida", com oito conselheiros a apoiarem essa conclusão, incluindo Balsemão e Mota Pinto, e sete a votarem contra.
Desfeita a AD, o PS foi a força mais votada nas legislativas antecipadas, sem maioria absoluta, seguido do PSD, com quem formou o IX Governo Constitucional, o chamado "Bloco Central", chefiado por Mário Soares, com Mota Pinto como vice-primeiro-ministro até fevereiro de 1985 e Rui Machete nos cinco meses seguintes.
A meio da III Legislatura, Aníbal Cavaco Silva, eleito presidente do PSD em maio de 1985, após reuniões para renegociar os termos da coligação com o PS, rompeu com o "Bloco Central" e pediu eleições legislativas antecipadas. A rutura consumou-se em 13 de junho, após a assinatura do tratado de adesão à CEE.
O Presidente da República anunciou a dissolução do parlamento em 27 de junho. Em comunicação ao país, em 03 de julho, Ramalho Eanes disse ter concluído, após várias diligências, que "não havia possibilidade de formar um Governo parlamentarmente viável" que afastasse o recurso a eleições antecipadas.
O PSD venceu as legislativas de 06 de outubro de 1985, sem maioria absoluta, e formou o X Governo Constitucional, executivo minoritário chefiado por Cavaco Silva, viabilizado pelo recém-fundado Partido Renovador Democrático (PRD) -- a terceira força mais votada naquelas eleições antecipadas, que teve como inspirador António Ramalho Eanes, na altura a terminar o seu segundo e último mandato presidencial, mas que depois lideraria o PRD.
A quarta dissolução do parlamento aconteceu na IV Legislatura, já com Mário Soares como Presidente da República, no seu primeiro mandato, e Eanes à frente do PRD, partido que apresentou no parlamento uma moção de censura que fez cair o X Governo Constitucional, chefiado por Cavaco Silva.
A moção de censura do PRD foi aprovada em 3 de abril de 1987 com votos a favor também do PS, que tinha Vítor Constâncio como secretário-geral, do PCP e do MDP/CDE. A dissolução teve efeitos no dia seguinte, 29 de abril, e as eleições foram marcadas para 19 de julho de 1987.
O PSD venceu essas legislativas com maioria absoluta, a primeira de um só partido após o 25 de Abril, e formou o XI Governo, chefiado por Cavaco Silva.
A quinta dissolução aconteceu quinze anos mais tarde, na VIII Legislatura, com Jorge Sampaio no seu primeiro mandato como Presidente da República, no rescaldo das eleições autárquicas de 16 de dezembro de 2001.
Na noite eleitoral, já de madrugada, António Guterres, que chefiava o XIV Governo Constitucional, um executivo minoritário do PS, partido com metade dos lugares no parlamento, anunciou a sua demissão das funções primeiro-ministro, declarando querer evitar um "pântano político".
O Presidente da República anunciou que as eleições legislativas antecipadas se realizariam em 17 de março de 2002 e assinou o respetivo decreto em 17 de janeiro, que foi publicado no dia seguinte.
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O PSD foi o partido mais votado nas legislativas e formou um executivo de coligação com o CDS-PP, o XV Governo, chefiado por José Manuel Durão Barroso, suportado por uma maioria absoluta de deputados no parlamento.
A meio da XIX Legislatura, Durão Barroso apresentou a demissão do cargo de primeiro-ministro para exercer as funções de presidente da Comissão Europeia, dizendo não ver necessidade de eleições antecipadas. Depois de ponderar se dissolvia ou não o parlamento, o Presidente da República decidiu "dar oportunidade à atual maioria de formar um novo Governo" e PSD e CDS-PP formaram o XVI Governo Constitucional, chefiado por Pedro Santana Lopes, que tomou posse em 17 de julho de 2004.
Passados menos de cinco meses, em 30 de novembro, Jorge Sampaio anunciou, através de uma nota, que tinha comunicado ao primeiro-ministro a decisão de ouvir os partidos e o Conselho de Estado para dissolver o parlamento e convocar eleições antecipadas.
O chefe de Estado entendeu que "a manutenção em funções do Governo significaria a manutenção da instabilidade e da inconsistência" e que "se tinha esgotado a capacidade da maioria parlamentar para gerar novos governos".
Face às palavras do Presidente da República, em 13 de dezembro, Pedro Santana Lopes foi ao Palácio de Belém apresentar a demissão do Governo, numa audiência que durou menos de dez minutos.
A dissolução foi decretada em 22 de dezembro.
O PS venceu as legislativas de 20 de fevereiro de 2005 conseguindo a sua primeira maioria absoluta no parlamento e formou o XVII Governo Constitucional, chefiado por José Sócrates.
Na XI Legislatura, com Cavaco Silva como Presidente da República, no início do seu segundo mandato, o parlamento foi dissolvido pela sétima vez, na sequência da demissão do primeiro-ministro, José Sócrates, que estava à frente do XVIII Governo Constitucional, já sem maioria absoluta.
A crise política foi aberta no final de fevereiro de 2011, quando o executivo minoritário do PS apresentou mais um pacote de medidas de austeridade, designado Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) IV, numa altura em que aumentavam os juros da dívida soberana portuguesa.
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Ao contrário do que acontecera anteriormente, perante o PEC IV, o PSD presidido por Passos Coelho recusou-se a negociar com o Governo do PS, considerando que a credibilidade dos socialistas estava esgotada.
O decreto de dissolução do parlamento e marcação das eleições foi assinado em 7 de abril.
Na véspera, Portugal tinha feito um pedido de assistência financeira à Comissão Europeia e em 03 de maio o Governo assinou em nome do Estado português um acordo com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu (BCE) e o Fundo Monetário Internacional - a chamada "troika" - para um empréstimo de 78 mil milhões de euros até 2013, compromisso que PSD e CDS-PP também subscreveram.
O PSD foi o partido mais votado nas eleições legislativas de 5 de junho de 2011, conseguindo com o CDS-PP maioria absoluta no parlamento, e as duas forças formaram o XXI Governo Constitucional, chefiado por Pedro Passos Coelho.
A meio da XIV Legislatura, no primeiro ano do seu segundo mandato, Marcelo Rebelo de Sousa tornou-se o quinto Presidente da República consecutivo decretar a dissolução do parlamento, na sequência do chumbo do Orçamento do Estado para 2022 logo na generalidade.
Terminava o ciclo de seis anos em que a maioria à esquerda apelidada de "geringonça" viabilizou orçamentos de dois executivos do PS, um quadro político inédito que já estava formado quando Marcelo Rebelo de Sousa foi eleito Presidente da República em 24 de janeiro de 2016.
O Presidente da República oficializou a dissolução do parlamento, por decreto, em 04 de dezembro, um mês depois de ter anunciado ao país que iria "devolver a palavra ao povo".
O PS venceu as legislativas antecipadas de 30 de janeiro com maioria absoluta e formou o XXIII Governo Constitucional, o terceiro com António Costa como primeiro-ministro.
A 7 de novembro, foi noticiada a abertura de um processo-crime do Supremo Tribunal de Justiça, visando António Costa. O primeiro-ministro apresentou a sua demissão de imediato.
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Os socialistas, gozando de uma confortável maioria absoluta no Parlamento, levaram a Belém o nome de Mário Centeno para assumir as funções de chefe do executivo. Marcelo Rebelo de Sousa não aceitou, dissolveu a Assembleia da República e marcou um novo plebiscito para 10 de março de 2024.
As eleições foram ganhas pela Aliança Democrática, ainda que por uma margem mínima sobre o Partido Socialista. Luís Montenegro foi empossado como primeiro-ministro do XXIV Governo Constitucional.
Na sequência de notícias envolvendo a Spinumviva, empresa familiar do primeiro-ministro Luís Montenegro, e da intenção do Partido Socialista criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o tema, o Governo decidiu avançar com uma moção de confiança.
Para trás tinham ficado duas moções de censura, superadas pelo Executivo devido à abstenção do maior partido da oposição.
Desta vez, porém, Pedro Nuno Santos não deu a mão ao Governo, o que provocou a demissão do Governo e a inevitável dissolução da Assembleia da República.
Após consultar o Conselho de Estado, nesta quinta-feia, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa convocou novas eleições para o dia 18 de maio.