22 abr, 2025 - 15:27 • Filipa Ribeiro , Daniela Espírito Santo
D. António Marto defende que o novo Papa deve dar continuidade ao trabalho iniciado por Francisco.
Em declarações aos jornalistas em Fátima, o cardeal português - que vai participar pela primeira vez no Conclave - defende que não deve haver retrocesso na Igreja, criticando os "nostálgicos do passado".
"Não se pode voltar atrás. Não podemos fazer retrocessos. Vivemos novas condições, novos desafios, que exigem novas respostas, novos caminhos, novos métodos, novas linguagens", assegura o cardeal, que acredita que Francisco "iniciou o processo" que "agora é preciso ser continuado".
A dois dias de viajar para Roma para participar pela primeira vez na escolha do novo Papa, D. António Marto realça que o novo chefe da Igreja pode ser um perfil fora da Europa, depois de também ter sido aberto esse caminho com a escolha do Papa Francisco.
"Foi o primeiro não-europeu e isso mostra que a Igreja não é eurocêntrica como, aliás, o mundo hoje não é eurocêntrico. A Europa deixou de ser o centro do mundo e o centro também da Igreja", explica o bispo emérito de Leiria-Fátima. "Estamos a assistir a uma certa decadência da Igreja aqui na Europa, em virtude de todo o processo de escolarização, e temos uma igreja florescente na África, na Ásia, na América Latina", reforça o clérigo, que acredita que a diversidade tem "maior expressão hoje no Colégio Cardinalíssimo", pelo que "não sabemos qual o resultado disso", mas que é importante e necessário que a Igreja continue aberta às novidades e às mudanças de época.
Para o cardeal, há uma forma de estar e pensar na qual a sua geração já não se enquadra completamente.
As novas gerações são "gerações do digital", mas isso "não é apenas uma técnica" ou "mexer nos algoritmos". "É uma maneira de estar no mundo, uma maneira de se relacionar... é uma maneira de pensar", assegura. "Temos de estar abertos às novidades do tempo, da cultura", repete, até porque, diz, "todos andamos à busca desses caminhos, dessas respostas" e "a Igreja já passou por muitas mudanças" de época.
D. António Marto
A população de Tronco está orgulhosa e feliz com o(...)
Surpreendido com a notícia da morte de Francisco, o cardeal português fala num tempo de orfandade para a Igreja e na saudade de um pai que deu muito aos católicos.
"Parece um tempo de orfandade para a Igreja. Todavia, a Igreja permanece numa atitude de gratidão e de reconhecimento para quem tanto deu e se deu, quer ao povo de Deus, quer à humanidade inteira. E é esse sentimento também que está presente no meu coração, em reconhecimento e gratidão", diz, admitindo saudade. "Saudade, sem dúvida. Mas pelo muito que deu e fica connosco. Sempre foi um pai e um profeta que partiu", lamenta.
D. António Marto foi nomeado cardeal pelo Papa Francisco e presidiu às celebrações do centenário das Aparições em Fátima em 2017, momento em que Francisco visitou Portugal pela primeira vez.
O agora cardeal lembra da disponibilidade que houve por parte de Francisco em beatificar os pastorinhos no Santuário de Fátima e fala numa dívida de gratidão de Portugal para o Papa Francisco.
"Para as comemorações do centenário ele só queria vir no dia 13 [de maio] e regressar. Disse-lhe que, em Fátima, não há 13 sem 12 à noite, com a procissão das velas... e ele acedeu. Também pedi que a canonização fosse aqui e não em Roma e ele mostrou toda a disponibilidade. Nesse aspeto temos uma dívida de gratidão para com ele", assevera.
A nível pessoal, D. António Marto lembra ainda o momento em que pediu ao Papa Francisco a renúncia como bispo da Diocese de Leiria-Fátima em janeiro de 2022.
"Quando fui pedir a minha renúncia estava com um certo receio que ele me pedisse para ficar mais algum tempo. Eu sentia já uma certa fragilidade de ordem física, uma vez que tinha uma doença bastante grave... e ele ouviu até ao fim. Esperei pela resposta e hoje posso dizer que ele me disse: 'Estou admirado com a tua humildade'. E pronto, fiquei descansado", desabafa.
Quanto à escolha de um novo Papa, D. António Marto acredita que "não será um processo demorado". "Já nos outros conclaves anteriores não foi. O Papa Bento XVI foi eleito à quinta votação, mas depois exigiu uma sexta para confirmar. Este Papa Francisco foi eleito à quinta votação. Normalmente há uma votação da parte da manhã e duas da parte da tarde, portanto, foram eleitos no segundo dia", refere.
Mesmo assim, o cardeal - que vai participar pela primeira vez no conclave - diz, a brincar, que parte para Roma daqui a dois dias com bilhete "só de ida", pois não sabe quando termina o processo.