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Capital Portuguesa da Cultura

Braga 2025 abre com "diálogo inesperado" entre folclore e breakdance

23 jan, 2025 - 10:24 • Isabel Pacheco

Propõe-se a incluir a comunidade e deixar um “legado de inspiração” aos jovens artistas. Braga 2025 arranca, sábado, com um espetáculo que cruza diferentes linguagens artísticas e identidades.

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Ouça a reportagem de Isabel Pacheco

David Moreira é um dos dançarinos de folclore de Braga que integra o elenco do espetáculo Quimera que estreia no sábado, na cerimónia de abertura de Braga 2025 - Capital Portuguesa da Cultura.

Atravessou o atlântico em 2022 para morar em Braga. Desde então, é membro do grupo folclórico da Universidade do Minho. Já tinha experimentado o dance street, no Brasil. Agora, em Portugal, rendeu-se à tradicional dança do Minho.

"Foi só voltar a gostar de novo de dançar e pronto...”, simplifica o jovem que compara o samba ao folclore.

“Eu até brinco porque o passo do Vira [minhoto] parece um samba. Há só uma ligeira diferença: é que a gente não vira o pé no folclore e no samba vira”, explica o brasileiro que garante que foi “super fácil” aprender. Até, porque, acrescenta, “ é tudo muito parecido”.

Em palco, David junta-se a mais 31 elementos de diferentes grupos de folclore de Braga, oito dançarinos de breakdance, três deles brasileiros e um espanhol, e uma bailarina de dança contemporânea. O elenco dá corpo ao projeto colaborativo que une as visões dos coreógrafos Deeogoo Oliveira e Filipa Francisco.

A coreógrafa, que há 14 anos se dedica à dança tradicional portuguesa, explica que este “é um projeto que trabalha o folclore de forma mais abstrata” em que “as danças dão origem a outras danças e mais formas no espaço”.

A arte como “gesto político”

Mas, mais do que dança, Quimera é também palavra, através da poesia de Regina Guimarães e da música, com o piano do bracarense José Diogo Martins. Trata-se de “juntar linguagens diferentes”, resume o encenador Jonh Romão.

“Estamos sempre a tentar estabelecer novos diálogos entre aquilo que à partida não é dialogante. Na verdade, a arte tem essa capacidade de desenhar diálogos entre o inesperado”, aponta.

“Acredito neste conceito de interdisciplinaridade porque, também, é um gesto político. Não é só um gesto artístico”, explica o, também, curador que, em Quimera, transpõe para palco a capacidade de inclusão da arte ao relacionar “coisas diferentes” à semelhança da relação “com o outro”, “com aquilo que é diferente de nós”.

Isso também é visível na multiculturalidade do elenco com várias nacionalidades. “Há uma inclusão muito grande”, reconhece. “Isso reflete-se nas estéticas deste espetáculo”. “Não há identidade restrita a uma geografia”, conclui.

O coordenador artístico de Braga 2025, Luis Fernandes, lembra que parte do programa da Capital Portuguesa da Cultura é “assente na participação da comunidade” e isso inclui os migrantes que, atualmente no concelho, representam 130 países.

“Para nós é fundamental integrar de diferentes formas aquilo que é a comunidade local”, destaca o programador que, dando o exemplo do Theatro Circo que dirige artisticamente, enaltece os contributos dos migrantes, perto de 30 mil na cidade, em vários projetos culturais.

“Desejar” é um desses projetos que vai culminar na realização de um festival em junho e que resulta dos contributos de “pessoas de diferentes nacionalidades desde africana a brasileira”, nota Luis Fernandes.

“Há uma comunidade incrível de pessoas brasileiras que tem trazido muitas mais-valias para aquilo que é o pensamento sobre a cultura da cidade e a sua materialização”, sublinha.

Braga 2025 quer deixar “legado da inspiração”

Gonçalo Araújo é um jovem artista plástico que regressa a Braga este ano.

Encontramo-lo no centro comercial de Santa Cruz, no centro da cidade. Neste shopping de primeira geração instalou o seu atelier numa das lojas no res-do-chão do edifício. Uma espécie e open studio sem montra ou paredes. Há apenas uma cortina amarela, cor de Braga 2025, que o separa do público.

“No fundo é um convite à interação social”, resume o artista, residente no Porto. “Tanto é que, muitas vezes ,estão pessoas sentadas no atelier ou desenhos no chão que não fiz”, explica.

“Aqui sinto que estou sempre em exposição."

E é essa a intenção. Gonçalo prepara uma instalação sonora, apresentar no dia da abertura de Braga 2025, que resulta da recolha das histórias da história deste espaço comercial. “ A interação é essencial”, sentencia.

“São estes projetos de maior proximidade os que realmente dão mais significado à arte na vida das pessoas”, defende o bracarense que vê no evento cultural a oportunidade para mostrar o seu trabalho “num grande palco”.

“É sempre importante haver este incentivo, principalmente, fora das grandes cidades como o Porto e em Lisboa, sobretudo, na minha cidade”, reconhece orgulhoso. “Deveria haver maior abertura noutras cidades. Só tem pontos positivos”, aponta.

Outro jovem talento que volta à sua terra natal ao abrigo de Braga 2025 é José Diogo Martins. O pianista, que atua no espetáculo de abertura do evento cultural, espera que a Capital Portuguesa da Cultura sirva de trampolim para a “quantidade esmagadora de músicos que a cidade cria todos os anos”.

“Já que Braga abre essas portas para formar músicos, também, faz todo sentido receber de troca essa arte”, nota o músico formado no conservatório de música Calouste Gulbenkian de Braga.

E dar palco aos talentos emergentes é um trabalho que já está a ser feito na cidade e que terá “mais preponderância este ano”, garante à Renascença Luís Fernandes, coordenador do programa artístico do evento.

A aposta não é só nos “grandes estabelecidos”, mas também “ nos artistas emergentes quer da cidade, como do país”, sublinha o programador que alerta, no entanto, para importância da presença de figuras internacionais do mundo artístico na programação de Braga 2025.

Trata-se de “uma oportunidade para uma série de artistas que estão em formação de verem estes artistas no local onde vivem”. “Tem o pendor de inspirar”, defende Luis Fernandes que aponta esse como o principal legado da Capital.

“É fundamental aprender com as referências de perto para a criação de um tecido artístico saudável e robusto. E este legado é pouco tangível, mas mais relevante do que obra física”, defende Luis Fernandes.

“É este legado imaterial que carece de muito estímulo e trabalho que espero que se verifique para lá de 2025."

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