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Castro Mendes: "Os poemas são garrafas atiradas ao mar. Não sabemos quem os lê"

31 jan, 2025 - 09:30 • Maria João Costa

Luís Filipe Castro Mendes,antigo ministro da Cultura, tem novo livro de poesia. Em “As Manhãs que Não Conheces” escreve sobre as “desgraças”, as guerras na Ucrânia e Gaza, mas também sobre memórias e amor. Crítico, Castro Mendes diz que “temos uma grande necessidade de promoção da leitura e da literatura” nas escolas.

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Já foi embaixador e ministro da Cultura, mas será sempre poeta. Luís Filipe Castro Mendes acaba de lançar um novo livro de poesia. “As Manhãs que Não Conheces” (ed. Assírio e Alvim) é uma obra que revela o olhar do poeta sobre o mundo de hoje.

Os seus poemas cruzam-se com a atualidade. Estão lá guerras com a da Ucrânia ou conflitos como o de Gaza. Em entrevista ao Ensaio Geral, da Renascença, explica que os seus poemas “respondem a estímulos que podem ser de vária ordem”.

“Reagem e respondem à situação em que vivemos e àquilo que sentimos por dentro da situação que vivemos. Portanto, os meus poemas, na medida em que em grande parte são respostas, é claro que os duros e difíceis tempos que atravessamos estão presentes neste livro.”

Questionamos, por isso, se é o olhar do diplomata a interferir na arte poética. Castro Mendes explica que “não é uma preocupação específica de um diplomata”, e que “os poemas que têm que ver com a situação mundial não têm que ver com o trabalho de um diplomata. É aquilo que sente qualquer pessoa atenta aos dias de hoje”, sublinha.

Poeta do seu tempo, que diz responder à vida com poesia, Castro Mendes escreve num dos versos de “As Manhãs que Não Conheces” que “A poesia dirige-se a um leitor desconhecido”.

Nas suas palavras, “os poemas são assim, umas garrafas atiradas ao mar. Não sabemos quem os lê. Temos às vezes grandes surpresas quando encontramos pessoas que nos dizem: ‘Li. Gostei dos seus poemas’”.

Para o poeta, “não há dúvida que as redes sociais favorecem esses encontros do autor com os seus leitores”. Castro Mendes considera que “a mensagem do poema vai direta ao coração de alguém que não nos conhece”.

Mais literatura em ambiente escolar

“O meu mito de escrever poemas é isso, embora saiba que a maior parte das pessoas que vão ler este livro são pessoas que eu até conheço”, diz a rir. Interrogamos então o antigo ministro da Cultura sobre os hábitos de leitura em Portugal.

Na sua opinião, “temos índices de leitura relativamente baixos”. Castro Mendes aponta por isso “uma grande necessidade de promoção da leitura e da literatura no ambiente escolar”.

Temos de deixar aquela ideia que o ensino do Português tem que se cingir a textos simples e diretamente comunicativos, porque o enriquecimento da capacidade da linguagem faz-se muito na linguagem literária”, sublinha.

Penso que, primeiro, haveria que reforçar o estudo da literatura portuguesa nas nossas escolas e depois, todo o trabalho que as bibliotecas têm, os clubes de leituras e também muita atividade dos leitores por esse país fora é muito interessante e positivo para isso que se está a passar.”

A nossa esperança situa-se no imprevisível

Num livro onde Luís Filipe Castro Mendes estabelece um diálogo com poetas da sua geração que já morreram, como Nuno Júdice ou Manuel António Pina, o leitor vai encontrar uma obra onde, embora se fale das “desgraças” dos dias de hoje, há também esperança nas palavras poéticas.

“A nossa esperança, hoje, situa-se no imprevisível, naquilo que surge sem prevermos. Temos tido muitas más surpresas ultimamente, mas também teremos certamente boas surpresas. Penso que há razões para ter esperança, na medida em que há muita coisa em nós que resiste, a nossa própria humanidade, e a nossa vontade de sobreviver, de amar e de continuarmos”, aponta.

Castro Mendes remata dizendo que “há sempre uma esperança, mesmo que a gente não a veja, porque só vai ver quando ela acontecer”.

O poeta, que escreve num dos versos deste livro que “A funda respiração da poesia alarga os pulmões, abre alamedas e faz conceber a liberdade”, explica ao Ensaio Geral como organizou este seu novo livro.

“A primeira parte do livro é sobre os nossos mortos. Com a minha idade, começamos a ver a morte dos nossos companheiros de geração. Depois, a seguir são as desgraças do mundo. Depois uns poemas relativos a isto de escrever poemas. E no final, então, retratos e autorretratos. É um encontro com a pessoa que está a escrever. Depois uma dança final, que é a dança da morte e da vida, da esperança e do desespero.”

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