18 fev, 2025 - 19:45 • Maria João Costa
A entrevista começou com o novo livro de Elizabeth Strout, mas foi quando lhe perguntamos pela atual situação da América que a autora mudou de expressão e de tom de voz.O sorriso e entusiasmo com que falava de “Conta-me tudo” (ed. Alfaguara) mudou. A voz e o olhar ficaram graves.
Em entrevista à Renascença, Elizabeth Strout confessa-se preocupada com a eleição de Donald Trump. “O que está a acontecer na América agora é muito assustador para mim. É terrível. Todos os dias quando me levanto há algo de novo a acontecer e acho isso muito desestabilizador e muito preocupante”, afirma.
A autora, que está pela primeira vez em Portugal evenceu o Prémio Pulitzer em 2009, teme “imensas consequências” da mudança política na Casa Branca.
Strout dá um exemplo pessoal para exemplificar o clima que se vive: “Um dos meus melhores amigos há 50 anos, é apoiante de Trump e então, não falamos do assunto. Não falamos de qualquer coisa que se passe no país. Isso porque queremos salvar a nossa amizade. É estranho!”
Nas palavras da autora esta situação, “é um bom exemplo de quão polarizado está o país”. “Eu conheço-o há 50 anos, é um bom amigo e eu não quero perder a amizade! É assim a história da américa agora”, diz em tom conformado.
E qual o poder da literatura no meio de tudo isto, perguntamos à autora. A literatura não salva, diz Elizabeth Strout, mas pode dar “conforto” e levar os leitores a entender diferentes pontos de vista.
O livro que Elizabeth Strout está a lançar em Portugal é um romance onde a autora junta Lucy Barton e Olive Kitterridg, duas personagens de livros anteriores.
Perguntamos por isso a Strout se foram as suas personagens que lhe pediram para regressar. Recusa a ideia e conta: “Um dia estava a passear e apercebi-me que a Olive e a Lucy viviam na mesma cidade. Não sei porque isso não me ocorreu antes.”
“Quando me apercebi pensei, UAU! Vamos juntá-los só por graça! Foi esse o ponto de partida para este livro”, explica a escritora.
Em “Conta-me tudo”, Olive passa os dias a contar histórias à escritora Lucy e a escritora Elizabeth Strout confessa que também ela sempre se questionou sobre as histórias por contar.
“Sempre me interessei imenso pelas pessoas com quem me cruzava na rua, porque olhava para elas e pensava: tu tens uma história, eu nunca vou saber essa história e provavelmente muita gente nunca a conhecerá! Mas é a tua história e isso é muito interessante para mim.”
Esta curiosidade de Elizabeth Strout tem é a mesma que está nas suas personagens. “A Olive é uma pessoa muito curiosa com todos os seus problemas. E claro, a Lucy é também muito curiosa sobre as pessoas. Então, elas desfrutam muito do tempo que passam juntas a contar histórias. Mas o que está por debaixo dessas histórias é a sua amizade.”
Uma amizade a que se junta Bob Burgess, outra personagem já conhecida dos leitores de Elizabeth Strout.
“Na minha cabeça ‘Conta-me Tudo’ quer também dizer: vou ouvir com atenção. Ouvir realmente alguém, acho que é algo raro, por isso, ser-se ouvido é ser visto e esse é o subtexto deste livro. É dizer, por favor, vê-me, nem que seja por 5 minutos, vê quem eu realmente sou”, sublinha a autora.
Este livro, cujos capítulos são vários livros, foi escrito não do princípio para o fim, indica a autora. Elizabeth Strout confessa que escreve “cenas” e que só depois ordena os capítulos.