14 mar, 2025 - 07:00 • Jaime Dantas
Uma boa parte dos portugueses dorme mal, e apesar de serem poucos os dados disponíveis, a realidade tem piorado ao longo dos anos. Segundo um inquérito da Associação Portuguesa do Sono (APS), metade dos adultos em Portugal dorme menos de seis horas, quando o período de referência se situa entre as sete e as oito horas por noite. Esta sexta-feira assinala-se o Dia Mundial do Sono.
As conclusões deste questionário superam as de um outro levado a cabo pela Sociedade Portuguesa de Pneumologia que, em 2019, dava conta de que 46% dos adultos dormiam menos do que o adequado.
As crianças não fogem desta realidade: o estudo “Onde dorme o meu filho”, da APS, revela que cerca de 30% das crianças até aos 12 anos têm algum distúrbio do sono. A mesma pesquisa mostra que 24% dos mais pequenos dorme no mesmo quarto que os pais, ao passo que 18% partilha a mesma cama.
Especialista do sono assegura que, "nos últimos do(...)
À Renascença, a presidente da APS, Daniela Ferreira, justifica esta realidade com as mudanças nas dinâmicas da sociedade portuguesa. “O mundo agora não pára. As pessoas são muito ativas, tanto a nível laboral como pessoal. Os dias estão a esticar-se e o tempo não aumenta”, diz. Os dados indicam que "os portugueses têm tendência a dormir menos do que é adequado. Dormem pouco e mal", afirma.
Nas ruas do Porto, não é difícil encontrar caras que encaixam na estatística. Ana Maria, de 60 anos, conta que “dorme cinco a seis horas e, se acordar a meio da noite, não consegue voltar a adormecer”.
A mesma queixa tem o estudante Afonso Alves, de apenas 18 anos, que diz “ser complicado conciliar o sono com o estudo”. “Quando durmo mal já sei que não vou conseguir estudar”, conta.
Já Jorge Tavares não tem queixas quanto à qualidade do seu descanso, mas repara que "as pessoas dormem mal, porque andam cansadas e sem energia”.
Não é preciso inventar a roda, explica Daniela Ferreira. “Mais do que as horas do sono, o que importa é manter uma rotina”, que permita “o nosso corpo entender o sono, para que possamos adormecer mais rapidamente e termos menos despertares”.
Também estão em voga os rituais de “higiene do sono”, que a especialista considera que “deveriam ser implementados”, e nos quais se incluem evitar o consumo de cafeína, álcool e refeições pesadas perto da hora de deitar. Deve ainda ser tido em conta o conforto e a temperatura do espaço de descanso e evitar ao máximo o contacto com os ecrãs.
Nos últimos anos, os “smartwatches” têm vindo a substituir os relógios tradicionais. Medem vários dados relevantes, como a frequência cardíaca, passos, calorias queimadas, o stress e a qualidade do sono.
Esta informação, acredita a presidente da Associação Portuguesa do Sono, pode “ter um impacto positivo” por aumentar a consciência para o tema. “Muitas vezes, as pessoas não têm a noção de quantas horas dormem. Se a aplicação mostra que estão continuamente a dormir seis horas e isso fizer com que modifiquem os seus hábitos, é muito positivo”, considera.
Exemplo dessa mudança de estilo de vida é o de Ana Vásquez. Todos os dias percorre a marginal da foz do douro, no Porto, para a sua corrida matinal e conta que “sente uma diferença enorme na sua energia desde que começou a dormir melhor”.
O relógio inteligente “ajuda, principalmente, na disciplina do sono”, conta a mulher de 41 anos. “Eu tenho uma aplicação que vai enviando alertas à medida que a noite vai caindo e isso ajuda-me a ter noção de quão disciplinada ou indisciplinada eu estou a ser naquele dia em relação à hora de dormir”, afirma.
Existe, no entanto, “o reverso da medalha”, uma vez que, em alguns casos “as pessoas estão tão focadas que não largam a aplicação mesmo antes de ir dormir”, lembra a médica Daniela Ferreira.
A especialista lembra que, apesar de serem úteis, estes dados não “têm validade clínica”, uma vez que analisam a informação baseando-se em sensores de movimento e frequência cardíaca, diferente do que acontece com uma polissonografia, realizada em ambiente hospitalar.
Normalmente, os dispositivos que monitorizam o sono subdividem-no em três categorias: sono leve, sono profundo e sono REM (sigla de "Rapid Eye Movement", que se traduz por "movimento rápido dos olhos”).
O sono leve é a primeira fase do sono. Caracteriza-se por uma sensação de relaxamento, mas estando ainda a atividade cerebral ativa, o corpo é mais sensível a despertares.
Logo a seguir, ainda “na primeira metade da noite”, vem o sono profundo, que se caracteriza “pela estabilidade a nível cardíaco”, explica a presidente da APS. “Por isso é que muitas vezes as pessoas dizem que dormem melhor na primeira metade da noite”, continua.
Por fim segue-se a fase REM, que é de todas “a mais ativa a nível cerebral e cardíaco”, e é nela “que ocorre a maior parte dos sonhos”, conclui a especialista.