07 abr, 2025 - 20:49 • Maria João Costa
É aos lutadores e aos loucos que dedica o livro “Tudo pede Salvação” (Ed Paulinas). Danielle Mencarelli relata a sua experiência pessoal na obra que a Netflix adaptou a uma série televisiva.
Hoje, Danielle Mencarelli tem 50 anos. O autor nascido em Roma é casado e pai de dois filhos. Mas a sua vida já foi diferente. Para trás tem uma história de dependência de álcool, drogas e de violência contra a família.
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Em “Tudo pede salvação”, Mencarelli narra a experiência de um jovem internado involuntariamente numa ala psiquiátrica. Inspirado na sua experiência pessoal, o livro foi adaptado pela Netflix.
A obra faz parte de uma trilogia. O seu primeiro livro “A Casa dos Olhares”, já também traduzido para português e publicado pelas Paulinas Editora em 2023, vai também ser adaptado ao cinema em Itália.
Vencedor do prémio Strega Giovani em 2020, Danielle Mencarelli diz em entrevista à Renascença que “foi uma grande emoção” e “oportunidade” ver o seu livro “Tudo pede salvação” adaptado por uma grande plataforma de streaming.
“Sabemos que o mundo da edição em papel é hoje um mercado muito pequeno em comparação com o mundo das séries e dos produtos audiovisuais. Saber que a minha vida estava a sair em 187 países, foi uma grande oportunidade”, indica o autor.
Mas Danielle Mencarelli vai deixando ao longo da conversa ideias que transmitem a sua humildade. “Sou um homem que não fica tanto no que aconteceu ou está a acontecer, mas sim no que vai acontecer”, diz-nos este escritor que acabou a trabalhar num hospital pediátrico e para quem o confronto com a fragilidade da vida o levou a mudar o rumo da sua.
“Tudo pede Salvação” relata o que Danielle Mencarelli diz ter sido uma provação, daí fazer questão de sublinhar que mostrar a sua vida aos outros é uma responsabilidade.
“A vida é uma provação contínua. Todos os dias devemos procurar razões para a salvação, através da salvação dos outros”
Neste caminho de sofrimento e redenção, Mencarelli refere: “Todos os dias devemos encontrar razões para a conversão daqueles que aspiram à fé, caso contrário arriscamo-nos a viver do passado, mas o homem não vive de particípios passados”.
Na obra, o autor conta a sua realidade, mas também aborda a de outros hospitalizados. Dando testemunho de outros sofrimentos, descentra-se da sua própria vida, compreendendo como não está sozinho e que a salvação surge a partir do outro.
Numa época de individualismo exacerbado, este italiano que vive com os pés no presente remete-se a um segundo plano. “Escrever apenas sobre mim iria aborrecer-me muito. Eu não acredito que seja mais importante do que tudo o que está a acontecer agora, fora desta livraria onde me está a entrevistar”, aponta.
“A realidade é muito maior do que o indivíduo e, por isso, adoro a ideia de me colocar à disposição da realidade”
Perguntamos-lhe se é uma missão. Não o vê assim, mas nesta breve passagem por Portugal, a convite da Paulinas Editora e do Instituto Italiano de Cultura, dividiu o seu tempo, entre palestras sobre o livro e sessões de autógrafos e encontros com jovens para falar da sua vida.
Danielle Mencarelli tem, entretanto, um novo livro, mas que ainda não saiu em Portugal onde fala sobre autismo. O autor continua assim num registo autobiográfico, já que escreve a partir da sua experiência pessoal, com o filho.
Mas Mencarelli, mais do que um prosador, diz-se um poeta. Foi essa a sua primeira forma de escrita. “A poesia foi a primeira e é a única forma”, afirma.
“Continua a ser a minha forma de traduzir em palavras a realidade em que vivo, no sentido em que quando vejo algo que me impressiona, o que acontece é basicamente compactar, resumir tudo em pouquíssimas palavras”.
Questionamos se isso não será mais difícil e exigente. Mencarelli remata admitindo que sim, mas acrescenta que “é mais emocionante, porque, como dizia Charles Bukowski, a poesia diz muito em pouco e a ficção muitas vezes diz pouco em muito”.